sexta-feira, 4 de março de 2011

METADE - OSWALDO MONTENEGRO

Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio

Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe Seja linda ainda que tristeza Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada Mesmo que distante Porque metade de mim é partida Mas a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso mas a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste, e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.

Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui A outra metade eu não sei.

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia E a outra metade é canção.

E que a minha loucura seja perdoada Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.

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